𝐩𝐨𝐫 𝐋𝐞𝐨𝐧 𝐁𝐢𝐧𝐠.
Tem algo de estranho acontecendo com a minha esposa. E eu preciso desesperadamente saber o que é.
Para ser muito sincero, até comigo mesmo, eu estava me sentindo fora da realidade nos últimos dias. Talvez um modo de defesa do meu próprio cérebro para conseguir lidar com o que está acontecendo ao nosso redor. Por esse motivo, não estranhei de início o fato de Clarice estar frequentemente me olhando com medo. Bem, parecia medo, mesclado a ansiedade e culpa. E ela estava me evitando, eu tinha certeza. Nesse momento em que escrevo, ela provavelmente está no cômodo de baixo lendo um livro que encontrou recentemente num baú embaixo da nossa cama.
Tudo bem que, por vezes, eu reclamo sobre a capacidade da minha esposa de falar demais. Mais do que ela deve, mas enquanto ela se mantém tão distante, percebo que é muito mais difícil lidar com o silêncio e a indiferença. Eles me fazem imaginar coisas que eu definitivamente não quero. O certo a se fazer é perguntar o que infernos está acontecendo com ela, você deve estar se perguntando. As coisas não são tão simples assim, crianças, quando você não sabe o que uma mulher está pensando. Não estou me acovardando, estou expondo fatos, sendo cauteloso. Conheço muito bem a esposa que eu tenho.
Do lado de fora da pensão, há somente névoa e nuvens muito carregadas. São seis da tarde.
A previsão do tempo tinha sido clara quando anunciava sol forte e ar úmido, mas aparentemente eles haviam cometido um erro grotesco. O dia estava tristemente fechado. De início, até tentei ignorar o céu e focar em outras coisas. Ligar a televisão foi meu primeiro erro. O jornal noticiava o pior (como tinha virado comum), de casas se tornando necrotérios e um sistema de saúde sobrecarregado. A capital do país, Guayaquil, está sofrendo como poucas cidades da América Latina. Somente ontem, mais de 700 pessoas morreram.
Costumo ler todas as mensagens que vocês nos enviam aqui e no Instagram. A situação do Brasil está se tornando caótica. Agora nós invejamos nossa vizinha, a Argentina, que está lidando com a situação com muita responsabilidade. Esse é o preço que nós pagamos pelos que não sabem votar, lembrem-se disso. E, por enquanto, tentem manter a calma. É difícil saber o que vai acontecer no futuro, então tentem se manter seguros. Não esqueçam da máscara e do álcool em gel. Se puderem, fiquem longe dos idosos.
Eu não quero ver vocês no obituário do Jornal Nacional.
Foto do meu novo amigo, Hector.
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